segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Paciente acamado: vida e morte

Ainda que chuvas torrenciais turvem-nos o dia,
logo mais despontará o Sol com todo o seu esplendor
trazendo-nos à face novamente o riso.

Para nós, é mister chuva e sol!
Chuva o tempo necessário
para fazer brotar a vida
que de algum lugar se insurge sob todas as formas.
Depois, vem o sol brindar esse milagre que é existir.

Então, existir precisa ser verdadeiramente
o que é, de fato: a percepção de algo mais do que vemos.

Percepção da fragilidade dessa massa que se constrói com o tempo
e do percurso que, às vezes, a transforma em algo que se não quer ver.

Percepção de que ainda que ao ser humano reste apenas
o corpo inerte numa cama
sem que nele não mais incida a luz do sol
de que ainda que o olhar
não mais veja o colorido dos dias ensolarados
que os ouvidos
não mais ouçam os agradáveis pingos da chuva
que a boca
não mais se abra naquele adorável sorriso ruidoso
e que apenas o faça para deglutir sem paladar
ainda que os braços
não mais abracem aqueles que lhes anseiam tanto
e ainda que as pernas
não mais corram para alcançar o ônibus
ou mesmo que para correr atrás de belas borboletas

Ainda assim,
enquanto o corpo quente nos gritar: vida!
Há vida. Não morte.

Então, é preciso olhar para o acamado.
Perceber que todo ele é vida.
E a vida exige sorrisos, abraços, de todos!

No recôndito obscuro daquele ser,
onde a nós não é mister conhecer – ecoa vida!
Naquele silencioso corpo inerte numa cama
Há vida e esta há de perceber os que estão à sua volta.

Esse corpo de que falo
É o da minha querida, linda e doce irmã
Desde janeiro acamada e no mais absoluto silêncio,
à espera do dia em que Deus a honrará,
levando-a para sempre - àquele lugar misterioso -
onde o corpo não mais será apenas essa matéria que sofre.
Maria Lúcia Carneiro da Silva

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